terça-feira, 8 de novembro de 2011

Ouro Preto


Chegamos em Ouro Preto dia 12 de outubro e pegamos o final da festa do 12. Os ex-alunos voltam para suas repúblicas e financiam uma festa para quem quiser entrar, com tudo por conta. Praticamente todas as repúblicas mais tradicionais entram na folia. Hospício, Necrotério, Pulgatório, Tôa-Tôa e muitas outras. Algumas com quase cem anos de tradição.

República Hospício
Nesse dia encontramos 2 casais de BH e ficamos conversando um bom tempo com eles, galera gente boa demais, curtiram muito o projeto, eles pedalam também.

Galera de BH
Fiquei na função vender adesivos na Praça Tiradentes, onde o inconfidente fora enforcado. Combinamos que cada um faria um turno para conseguir um local para ficar ou um almoço. O mindu começou e já arranjou uma república para hospedarmos nossos corpos cansados de uma subida de 12 km de Mariana até Ouro Preto e também um almoço. Que maravilha.


Praça Tiradentes
Fomos para o restaurante, almoçamos e voltamos para a praça para o nosso ofício principal, vender alguns adesivos para custear a viagem. Após algumas transações bem sucedidas fomos para a República Tôa-Tôa.



Conheci o Cazuza, futuro geólogo que nos deixou a vontade para encostarmos as bikes no meio da boate da casa e tomarmos banho no fundo. Nos ajeitamos e quando subimos para conversar com os caras, eles estavam todos dormindo. Saímos para uma volta na cidade e não duramos muito, logo voltamos para descansar. A cidade é muito velha e suas casas antigas são puro mofo, fora que por ser uma das cidades mais altas do Brasil e ficar entre serras, as nuvens que ali chegam precipitam fácil e a mudança climática é intensa.


Só sei que acordei com a respiração meio congestionada, nada que um banho quente não resolva. Saímos para arranjar um almoço e depois fui patrocinado também por uma cabeleireira simpaticíssima que cortou minha juba.


Depois fomos conhecer a igreja de São Francisco onde abriga o Museu de Arte Sacra Barroca. Com pinturas do século XVIII e XIX, esculturas talhadas na madeira por artesãos da época onde se destaca o escultor e arquiteto Aleijadinho.

Igreja São Francisco de Assis

Feira de artesanato em pedra sabão e Igreja São Francisco de Assis

Depois fomos conhecer o seu museu com várias obras de época. Na volta passamos por uma casa de artes e conhecemos as obras dos artistas regionais, chamando atenção às pinturas de Di Paula com cores muito vivas e o uso marcante do roxo em suas pinturas. A alagoana que tomava conta da casa nos ofereceu sua casa para dormirmos, mas não foi preciso. Grande abraço alagoana.




Descendo a rua direita paramos no Bar Barroco, comemos umas coxinhas e logo caímos no rock. Conhecemos umas moças de uma república só de mulheres e foi lá que passamos a noite a base de um violão e muita energia cantarolante. Foi muito bom.

Mindu incorporando...

República Cafofo

Dia 14 sexta feira arranjamos um almoço e comemos na república. Conheci o Sandy e Junior que também foi no show do Metallica e ficamos conversando sobre música durante alguns minutos e então tentamos conhecer a Igreja do Pilar que estava fechada. Passamos para comprar um lanche e esperar o pessoal que ia chegar na república. O pessoal comprou umas biritas e uns petiscos para esquentar a noite. Peguei aulas com o saca-rolha e sua câmera profissional e de noite fomos à República Oxigênio.

Reunião na tôa-tôa
Em Ouro Preto você não pode nem ter a desculpa de não ter dinheiro para sair. Sempre tem algum lugar rolando um rock de graça e para nós isso era excelente, basta subir as ladeiras extensas de pedra sabão.
Sábado fomos a Igreja do Pilar, a 3ª igreja mais rica em ouro do Brasil ficando atrás de uma igreja de São Francisco na Bahia e a Matriz de Tiradentes. Uma contradição já que o santo desapegado vivia uma pobreza franciscana. Igreja riquíssima em detalhes feitos pelo mestre de Aleijadinho.

Igreja do Pilar
Terceira mais rica em ouro do Brasil
De noite fomos novamente à Oxigênio onde estava rolando uma festa frenética, as pessoas se jogavam na piscina, toda a casa estava empossada de água, muita cerveja de graça e um som ao vivo no alto da piscina. A festa estava boa até que começou a chover. O pessoal da república foi para outra festa e o pessoal do Pedalar é Preciso ficou a ver navios naquele mar de gente boiando na piscina. Procuramos outro canto mas não encontramos nada, então partimos para a república fazer uma janta rápida. Chegamos juntos com o pessoal dentro do carro com aquela cara de desapontamento de quem sai de algum lugar que está bom, imaginando outro melhor e não acerta na escolha.

No domingo acordei ás 7:00 h e fiquei lendo o Antônio Olinto e viajando em seus relatos. O cara foi o primeiro a dar uma volta ao mundo de bicicleta sozinho em 1993, época sem internet, inflação intensa e várias dificuldades que o tornara uma lenda para o cicloturista. 36 países, 46.000 km, 3 anos e meio, 2 mulheres com U$ 10.000,00. Acessem seu site www.olinto.com.br


Almoçamos no restaurante .... de um ciclista que nos atendeu muito bem, e depois conhecemos um carioca que foi do rio para Ouro Preto em uma speed durante 4 dias. Trocamos umas figuras sobre a prática de ciclismo e de outros esportes, e fomos ao Museu do Oratório. A igreja católica começou a sugerir que os fiéis, por muitas vezes morarem longe de uma igreja e não poderem cultuar o catolicismo, tivessem seu próprio oratório. Daí surgiram oratórios de viagens, oratórios bala, oratório de várias maneiras. Alguns tinham até uma gavetinha em baixo onde os pedintes poderiam conseguir dinheiro para eles próprios ou para a construção de uma igreja ou uma capela por exemplo.

Triatleta Haroldo, Rio de Janeiro - Ouro Preto em 4 dias

Café Chopp Real
Museu do Oratório

A cultura brasileira colonial é basicamente religiosa com influências do barroco e seus adornos infindáveis para encher os olhos dos fiéis no templo sagrado. Rico em detalhes mas o conteúdo tem uma temática só; a propagação do catolicismo. Confesso que já estava um pouco de saco cheio de visitar igrejas.

Igreja N. Sra. do Carmo
Matriz N. Sra. da Conceição
Igreja N. Sra. do Rosário

No dia 17 fomos conhecer a Mina Chico Reis na chuva. Ficamos assustados com as condições dos escravos mineiros. Uma pequena volta pela mina, agachados e as costas doem, a roupa fica toda suja, o ar é pesado e com um feixe de luz se percebe que está respirando poeira mineral. Em poucos espaços se consegue ficar realmente em pé. Muitos escravos utilizavam uma máscara de ferro para não engolirem pepitas de ouro, trabalhavam nus e tinham uma expectativa de vida de 20 anos. Totalmente subumano. A água também era um problema já que não chegava para todo mundo e viam através de uma espécie de canos de pedra A mina tem cerca de 5 km de extensão e segundo o guia de lá foram extraídos 25 toneladas de ouro, que foram para Portugal e também patrocinou a Revolução industrial na Inglaterra. Dentro da mina existem vários caminhos e segundo o guia tinha um caminho escorregadio para cima que chegava até na Igreja. A senhora que também o acompanhava resolveu dar meia volta, mas sua filha queria conhecer o novo percurso. Fomos subindo apenas com a luz de uma vela e de um celular e chegamos numa área maior onde o caminho que poderia dar na igreja era de difícil acesso para a maioria dos turistas que passassem por ali. Não acreditávamos que seria ali já que tinha uma menina com a gente e o guia falou que o caminho era tranqüilo. Voltei para ver se não deixamos escapar outra entrada e quando chegamos na parte iluminada vinha outro guia e a mãe da menina assustados. Disseram que aquela área da mina não estava aberta para visitação com perigo de desmoronamento. Que guia irresponsável. Conhecer a Mina de Chico Reis foi uma experiência antropológica.

André mineiro

Essa nos acompanhou para o caminho proibido
Caminho proibido
Dia 18, terça-feira arranjamos um almoço em um restaurante muito incrementado. Depois fomos conhecer a Casa dos Contos e conhecer a história da moeda no Brasil. Desde as primeiras moedas com o semblante da Coroa Portuguesa de ouro pesando mais de 52 g, passando pelo papel moeda, cruzeiro, cruzeiro novo, cruzado, cruzado de novo, cruzeiro de mentira, cruzeiro real e terminando no Real em 1994.

Maket do museu Casa dos Contos



Embaixo da Casa dos Contos tem uma senzala com inúmeros artefatos para a dominação do negro africano. Castrador, palmatórias, vários tipos de chicote, o tronco onde eram açoitados, armadilhas que arrancavam o pé fora de quem nela pisasse, coleiras, balanças e vários objetos que mostram o quão penoso foi a escravidão. No fundo ficava um tanque de onde caia as fezes dos frequentadores da casa e além de ter que limpar aquela merda, dormiam amarrados sobre uma folha de bananeira. Terrivelmente impressionante. Na senzala não se pode tirar fotos.

Em seguida fomos ao Museu de Ciência e Técnica, que se divide em 5 partes; História natural, mineração, mineralogia 1, mineralogia 2, física...

Museu de ciência e técnica

Quarta feira conheci o museu da Inconfidência o mais organizado de ouro Preto. No mesmo ano da Revolução francesa, 1789, a inconfidência mineira teve como ícone o famoso Tiradentes que junto com os inconfidentes queriam a autonomia da colônia. Ele fazia pronunciamentos em praça pública e logo chamou atenção da Coroa que mandou enforca-lo e esquarteja-lo colocando suas partes nos lugares mais visíveis de Vila Rica. Engraçado que no museu tem uma carta da Rainha ordenando o assassinato com estas riquezas de detalhes macabros. Que medo!! Após sua morte, muitos outros foram cassados e mortos e sua imagem não foi publicada durante 1 século. No museu mostra as várias representações do semblante de Tiradentes ao longo da história, foi retratado até com muita semelhança a Jesus Cristo.

Museu da Inconfidência

De noite rolou o rock na república com o pessoal do 1º período. Os caras investiram mais de mil conto em cerveja litro, vodka barata e suco em pó para o batidão feito em garrafões 20 lts de água que foram estrategicamente distribuídos pela casa. Esperavam 100 pessoas mais foram umas 200. Lotou! Uma aventura da boate para o banheiro era como entrar em um moedor de carne com uma galera nova e muito louca. Uma mina me abraçou e pediu para que eu colocasse sertanejo, mal ela sabia que eu não morava na república e queria ouvir rock. Ela fazia 1º período de matemática porque gosta de fazer contas, mas queria mais tempo pra curtir sua vida e calculou que seria melhor fazer economia... de tempo. Ela como várias outras estudantes não imaginam o que querem da vida.

Na porta da festa, na tôa-tôa
Boate da tôa-tôa
O mundo nos cobra resultados rápidos e logo estamos nos degladiando em busca de um espaço em uma faculdade dentro de uma universidade de possibilidades. Não nos é mostrado a minoria dos caminhos e mesmo assim temos que imaginá-los, calar nossos hormônios que querem se auto-afirmar com o prazer mais próximo e escolher um rumo. Em conversa com os estudantes do 1º período de Ouro Preto se tem a nítida impressão de que ninguém sabe pra onde estão indo, simplesmente falam que gostam de fazer contas, então se formarão em economia, ou que não gostam muito de “sangue e essas coisas” então não vão para a área das biológicas. O mundo é dividido em quem consegue somar os lados de um quadrado do pessoal das exatas, de quem gosta de cachoeira, da biologia, de quem quer ficar extremamente milionário com os estudantes das biológicas e dos que tem preguiça do mundo das humanas.

A semana é dividida entre antes e depois da festa dos caras do 5º período e futebol, filmes sangrentos dublados, joguinhos de pc e rock é sinônimo de felicidade e lazer. Que os estudantes me perdoem mas se forem fazer uma cirurgia no cérebro e verem um diploma de uma universidade dessas de cidade universitária rock and roll estampada na parede do consultório; corram! Se possível de bike. É claro que há exceções a toda regra, não juntemos tudo no mesmo saco...

No último dia acordamos em uma casa cheirando cerveja com o pessoal da distribuidora buscando o freezer com o caminhão bloqueando as ruas estreitas de Ouro Preto, gerando inúmeras ondas sonoras chatas das buzinas dos carros. Arrumamos nossas coisas, e despedimos da galera que nos hospedou muito bem. Um grande abraço para o Cazuza e pra toda galera da Tôa-Tôa, Soneca, Koiza, Jahmaica, James, SandyJunior, Paka, Saca-Rolha, Samu, Carioca, Delay, Meifrako, Bomba e Massacration.Se forem pra Goiás durante os próximos meses nos mande recado que temos vários amigos que podem hospedá-los em seus quartos e farão de tudo para lhes acomodarem como se fossem nós mesmos.

Ouro Preto foi a primeira cidade brasileira a ser tombada como patrimônio histórico e a terceira em todo o mundo... História viva.

Ouro Preto




Seguimos na estrada Real rumo a Lavras Novas, a subida para deixar a cidade só foi possível empurrando a bike e não foi a última ladeira...



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